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quinta-feira, 11 de junho de 2009

Esputo

Angustia. No canto úmido da boca parou o beijo:
Áspero, seco, singelo, apetecido.
Minha língua procurava tua cavidade bocal quente... Salivante nas vontades do ser... Solvente.
Nas ranhuras dos lábios ficaram o gosto atritante do desejo.
Ficou a fricção de quase nenhuma carne frigida.
Carne inerte, ansiosa por maior proximidade corpórea, confusa, amorfa.
Onde não se desmistifiquem os tecidos nem glândulas salivares de ninguém.
Onde só haja o agora, este instante onipotente travado e suspenso no canto.

Na ranhura do meu consciente parou a realidade, era obliqua, era pobre em vaidades.
E eu deslizei na suavidade dos versos, coadunando alucinações e a mortalidade existencial na complexidade da tua concupiscência.
A alma se desprendeu do corpo já sem vida,
A derme excitada delira na luxuria da tua boca.
Minha capacidade gustativa saliva por fluxos sexuais intensos,
Interrompidos pela beirada mal calculada, pelo olho cerrado antes do instante do beijo.
Foram segundos eternos de infinito.

Beijo, sim a palavra é doce.
Saliva pelos veios da arcada relutante e aflita.
Afiado vocábulo que teima em morder tua carne.
São só babugens dos sonhos, eu tenho fome, a minha fome deseja a fome de tudo,
A canalhice devoradora dos amores carnais.
Minha fome carniceira rosna pelos tecidos dos teus ossos,
Porções gustativas de prazer que cobiçam o infindo.
Angustia. No canto agora seco da boca eu expungi em volição,
Mordi o lábio arrepiei a nuca,
Enxuguei a boca.

Orientação

Sempre penso que minha força está na solidão,
Na lentidão do tempo, nos compassos simples que me enterram em desalentos.
Aprendi a ter medo das precipitações.
E sempre que a abóbada celeste começa a condensar os núcleos hidroscópicos é sinal de tempestade.
Isso me assusta, sou formado das trevas da noite,
Respiro a imensidão das estrelas, no abrigo do crepúsculo.
Sou feito da nebulosidade da existência com seus mistérios.
Disto sou acometido.
Mas tenho medo do viver, medo deste existencialismo fugaz que tanto me ludibria.
Tenho medo do novo, dos desamores porvir, das tristezas que inevitavelmente machucarão minha alma, abreviando-me ao pó.
Lacônicas cinzas que misturadas à água viram lama, ausência, merda.
Tenho medo do que não entendo. Queria ser mais racional.
Hoje uma parte de mim chorou.
A outra parte se perdeu tentando traduzir estes versos de morte.
Ansiava entender a prolixidade do que deveria ser simples,
E na simplicidade não ter medo do céu que desaba sem contar as malditas gotas.
E mesmo assim, ainda gosto de dormir sobre a sinfonia das águas.
Sobre tudo, quero ter a garantia de ao menos poder me iludir de novo.
E destarte pensar que estou entendendo e me orientando pelo pensamento de indecisão.
Bom, chego à conclusão que o melhor é a desorientação.